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Decreto sobre caução ambiental gera polêmica e revisão é cobrada por ambientalistas e Fiemg

Ambientalistas, parlamentares e associações empresariais pedem a revisão do Decreto 48.747 do governo de Minas, que regulamenta a caução ambiental da mineração. Instituída em dezembro, a norma cria uma espécie de seguro para empreendimentos minerários, em caso de tragédias como de Mariana e Brumadinho, ou descaracterização de barragens.

O gerente de Meio Ambiente e Relações Institucionais da Fiemg, Thiago Rodrigues, aponta dois artigos do decreto considerados pela entidade como impraticáveis pelo mercado. Em um deles, é exigido prazo indeterminado como requisito para fiança bancária. O gerente conta que essa exigência não é comum e há até mesmo uma resolução da Advocacia-Geral do Estado que permite apresentação, em Minas Gerais, de fianças com prazo mínimo de dois anos, desde que cumpridas algumas obrigações.

Outro ponto é o seguro-garantia. Uma das condições para que ele ser aceito é que a apólice seja emitida por seguradora com receitas de arrecadação de prêmios de seguro, no segmento danos e responsabilidades, superiores a R$ 6 bilhões no exercício anterior à contratação do seguro. O gerente da Fiemg aponta que, segundo dados da Superintendência de Seguros Privados (Susep), a seguradora líder desse mercado arrecadou R$ 670 milhões no ano passado, apenas 11% do exigido no decreto.

“Se a gente somar todas as seguradoras brasileiras, elas arrecadaram R$ 4,3 bilhões em 2023 nesse segmento de seguro-garantia. Ou seja, se somarmos todas juntas, elas não conseguem cumprir a exigência que o decreto fez para elas poderem ofertar esse produto no mercado”, afirma Rodrigues. “Defendemos a caução ambiental, mas queremos que o decreto seja exequível, porque senão o que vai acontecer é que as empresas não vão conseguir apresentar proposta de caução ambiental e vamos ficar nesse limbo”, completa.

Para ambientalistas e parlamentares, regras beneficiam mineradoras
Já o Instituto Fórum Permanente do São Francisco e a deputada Beatriz Cerqueira (PT) apontam que, do jeito que está, o decreto beneficia mineradoras infratoras.

Uma das principais vozes contra o decreto na Assembleia Legislativa de Minas Gerais (ALMG), a deputada Beatriz Cerqueira aponta que a regulamentação veio com cinco anos de atraso. O decreto está previsto na Lei Mar de Lama Nunca Mais, aprovada em 2019. “A legislação aprovada foi construída a muitas mãos de forma popular, tinha objetivo a celeridade. Essa demora beneficiou quem? Enquanto não tem regulamentação, quantas licenças prévias foram concedidas sem exigência da caução?”, critica.

Estudos apresentados na ALMG sobre a metodologia do decreto mostram que a caução ambiental para a tragédia de Brumadinho, que vitimou 270 pessoas e causou impacto socioambiental gigantesco na Bacia do rio Paraopeba, seria de apenas R$ 14 milhões. Para a tragédia de Mariana, que resultou em 19 mortes e com enorme impacto na bacia do rio São Francisco, R$ 62 milhões.

“Desconheço quem na sociedade civil possa pactuar com mecanismos que não tragam rigor necessário para que a tragédia não se repita em casos de rompimento e desativação de barragens. A caução precisa cumprir essa função e a metodologia tem valores baixos”, afirma Cerqueira.

Relatório aponta como caução ambiental deve ser calculada
O Instituto Fórum Permanente do São Francisco aponta em relatório que a base dessa fórmula tem origem de uma dissertação de Alexandre Masocatto Pulino, mas se limitou a selecionar um número ao desconsiderar premissas, contexto, informações de diversas naturezas e diversas limitações que foram inseridas e concatenadas no trabalho.

O Fórum afirma que, no pior caso de sinistro provável, como rompimento, o valor da caução deve ser suficiente para cobrir gastos com danos para a economia pública, vidas existentes no local, aos bens materiais e imateriais das pessoas, empresas, entidades e da sociedade nas áreas de risco direta e indiretamente afetados, e à fauna, flora e recursos hídricos existentes nessas áreas.

O valor deverá ser determinado por orçamento das obras de recuperação socioambiental e não apenas a descaracterização. Este orçamento deve ser elaborado pelas mineradoras e aprovado pelos órgãos fiscalizadores e licenciadores do Estado e da União ou por empresa contratada por eles, sem prejuízo da complementação dos custos por parte da mineradora, caso o valor não se mostre suficiente durante a realização das obras de recuperação.

O Instituto diz ainda que é necessário que acionistas sejam obrigados a assumir responsabilidade solidária pela recuperação, caso a caução não se mostre suficiente para a reparação a ser executada.

Fonte: Diário do Comércio

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